segunda-feira, 2 de julho de 2012

DETRAN, uma trovoada no escuro

Achei que resolveria a parada rapidamente e fui, documentos em punho, concluir o licenciamento anual e a liberação do veículo. Na recepção dos carros, avisei que só estava ali para resolver aquelas pendências; um pneu careca e a placa descolorida. 
Afinal, todos os pneus tinham sido trocados e mandamos pintar os números conforme a orientação do rapaz que nos atendera no sábado.
Ela disse-me para seguir até o posto 15 e ir até a sala de atendimento. Bem, fiquei lá na fila atrás de três outros veículos e esperei com paciência minha vez:
- A senhora tem que ir ali - apontou para uma estrutura de madeira e muitas janelas - para a liberação do veículo.
- Mas basta conferir a placa e os pneus...
- Não, a senhora está com o carro agendado para a liberação nesta semana, lá na sala de atendimento.
Parei o carro no primeiro canto que encontrei e fui até a tal sala. Abri a porta e eram mais de cem pessoas conversando com evidente irritação, sentadas em filas de cadeiras ligadas umas as outras. Um cartaz avisava:
PEGUE A SENHA AQUI!
Não, não é possível... Deve haver um erro. Enfrentei a cara de maldade dos que estavam por perto aguardando e falei com a mocinha do guichê:
- Olha, só preciso que vejam minha placa e os pneus...
- A senhora precisa ir ao posto 31!
Peguei os papéis de volta e fui feliz de não ter que enfrentar aquela encrenca.
No posto 31, esperei novamente minha vez e o rapaz:
- Não, a senhora não pode pintar os números da placa, tem que pagar o DUDA.
 Arrepiei e cresci:
- O moço disse que podia pintar a placa, droga, e agora?
- Vou falar com a supervisora...
Depois de uns dez minutos a supervisora chegou e examinou tudo, checou o agendamento e foi taxativa:
- Estava certo, a senhora precisa voltar para a sala de atendimento para a liberação do veículo.
Respirei fundo e estoicamente voltei para o antro dos horrores.
Quase que as mesmas cem pessoas conversavam ferozmente; e eu fui de cabeça baixa pegar uma senha.
Confesso que senti na nuca olhares corrosivos do tipo - a há, e queria se safar hein, espertinha?
São três tipos de senha. A minha era a 82 de uma sequência que ia pelo número 41. Fiz um calculo rápido. Vai levar uma hora, posso esperar. Vou brincar um pouco na internet, ver meus e-mails... Bateria fraca... Nenhum livro na bolsa, nada para ler... 
Peguei meu caderno e anotava as feições e posturas dos colegas de infortúnio; um bom exercício...
Mas estava frio, muitos aparelhos de ar condicionado operavam na potência máxima. A fila de cadeiras balançava com sofrimento em função de pés inquietos, ou de pernas agitadas. Toda a fileira chacoalhava. Cada um que entrava ou saía da sala largava a porta que se fechava automaticamente com um ruído irritante: Splec!
O zum zum das pessoas se misturava ao barulho da tela que indicava a senha da vez: Plin plon!
À uma hora da tarde houve a troca de turno; os colegas de trabalho se abraçavam e conversavam depois de um longo fim de semana. 
Após umas três horas, estávamos na senha 61 da minha categoria.
Havia um falatório - Vamos processar o DETRAN, é um abuso, se todos aderirem ganhamos esta causa. Todo mundo concordava em silêncio com aquele advogado que chegara meia hora depois de mim.
Mas por algum milagre ou pela maior eficiência do turno da tarde, a fila andou mais depressa. Antes das três estava em frente à Liliane que checou os documentos e disse que precisava também do meu RG e da certidão de casamento.
-Ahn????
Os documentos do carro estão no nome do seu marido, ou ele vem ou a senhora trás estes documentos.
- E vou ficar mais quatro horas na fila?!
- Bom, se a senhora trouxer as cópias dos documentos até as 16 h, pode vir falar comigo... 
- Não vai dar tempo, pensei, não vai dar...
Saí bem depressa, a identidade eu tinha comigo, mas quem carrega a certidão de casamento de mais de trinta anos na bolsa??
Voltei pela praia, para evitar o trânsito e senti uma ambivalência digna de um bom neurótico.
A velocidade máxima é de 60 Km/h e eu tinha muito pouco tempo para atravessar doze quilômetros.
Tensa, fui dirigindo no limite e nem reparei o mar que se exibia para mim.
Voando, peguei a certidão em casa, tirei a Xerox no shopping e tratei de me esmerar nas acrobacias de trânsito típicas dos cariocas.
Cheguei!
Fui direto ao guichê: 
- Consegui!
Ela pediu que eu esperasse mais um pouco e uns quinze minutos e trinta buzinadas do quadro de senhas depois ouvi dizerem:
- Miguel Antônio!
Opa, é comigo.
Lépida, acompanhei o sujeito que conferiu todos os pneus que tilintavam de novos e disse:
- Não pode mais pintar a placa, não, tem que trocar, tem que pagar o Duda.
Engrossei de novo:
- O moço disse que podiaaa!
- Ok, mas agora não pode mais, tá?
- Tá!
Quando saí eram 16h10min. Mas saí com meu troféu e uma sensação incrível de felicidade!
Consegui honrar o meu dia e dar cabo de uma tarefa complexa!
Uma salva de palmas para mim!






Um comentário:

Ana disse...

eu costumava dizer que quem nunca foi ao detran, não sabe o que é a vida :-D parabéns por ter conseguido!!!