quinta-feira, 5 de maio de 2011

Febre reumática

Quando eu tinha uns onze anos, de maneira insidiosa comecei a reagir mal aos estímulos. Sofria esgares e torções a cada vez que falavam comigo ou sempre que ficava nervosa ou na berlinda.
O que a princípio parecia ser uma  manifestação da adolescência, mostrou-se uma doença custosa; a tal da febre reumática na versão coréia. Simplificando, o doente tem mesmo movimentos involuntários, por uma inflamação em algumas áreas do cérebro e não há como evitar.
Atualmente quase não ouço falar dessa doença e das consequências dela, às vezes com lesões graves como a cardiopatia reumática.  " A febre reumática lambe as articulações mas morde o coração." 
Para prevenir novos surtos da doença é preciso evitar  certas infecções de vias aéreas e a profilaxia é uma injeção de Benzetacil por mês. Uma penicilina de depósito que vai sendo eliminada aos poucos para a circulação sanguinea.
Era assim: Uma vez por mês uma aplicação feita por mamãe, papai ou irmã-acadêmica-de-medicina. Era uma comoção, pelo menos para mim. 
Havia na casa,  um estojo de aço, com seringa de vidro  e agulhas reutilizaveis - até que ficassem rombudas. O estojo era muito bem guardado e era fervido em banho maria para esterilizar. Depois do advento da aids muita gente nem conhece este tipo de estojo, que cá entre nós era um charme.
Muitas vezes não havia álcool e usava-se o álcool da garrafa de pinga mais próxima.
Um belo dia, resolvi começar a ir até à farmácia tomar minha injeção privadamente. Pedia um dinheirinho para a mamãe e ia. Doía muito, desde a aplicação até uns dez dias depois, era sofrido.
Certa vez deixei passar o tempo e acabei doente de novo, desta vez com artrite, outra manifestação frequente.
Levei uma bronca da mamãe- cada um tem que cuidar de suas próprias doenças-  e lá fui eu para a cama de novo, repouso forçado. Foi muito bom porque aproveitei para ler os clássicos da nossa estante - Machado de Assis,  Monteiro Lobato, As mil e uma noites... e aprendi definitivamente que precisava cuidar de mim mesma e das minhas mazelas.
Certa vez fui tomar a injeção em uma farmácia da Tristão de Castro em Uberaba, que nem existe mais. O enfermeiro garantiu: Você não vai sentir dor alguma, vai ver! Mas eu já tinha ouvido isso muitas vezes... Preparei o músculo da vez e esperei pela dor pesada e infiltrativa.
Mas desde a aplicação e durante todo o próximo mês milagrosamente nada senti.
Procurei pelo meu benfeitor para as próximas aplicações mas nunca mais o encontrei.
Tenho cá minhas dúvidas... Acho que naquele mês quem me salvou foi meu anjo da guarda.
A injeção deve ter sido no máximo de soro fisiológico.

Um comentário:

Lena disse...

Acho que era um anjinho sim! Lembra do rosto dele?