quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Balas

Era fim da tarde, hora da soneca da Helena, que tinha uns quatro anos. A porta do quarto dela ficava aberta e como morávamos em um apartamento pequeno podia ouvi-la de onde estivesse.
Às vezes acordava e ficava brincando com as mãozinhas; algum tempo depois começava um chorinho de desconforto e eu esperava mais um pouco, que era para ela aprender a esperar... coisa que nunca aprendi, por mais que tenha esperado. Quando eu não dava mais conta ia pegá-la no colo e ficávamos esperando o "nosso pai" (era assim que ela chamava o Miguel.)
Mas naquela tarde, aquele choro, eu nunca tinha ouvido. Começou do nada, sem barulhinhos anteriores, um choro forte e triste, quase uma despedida.
Corri lá.
-"O que foi, filhinha? e já fui tirando do berço.
Então ela me contou: -" Eu vi uma balinha, quando fui pegar, ela... ela, vooooooou"; e chorava
e chorava.
Acho que foi o primeiro "pesadelo" de que ela se lembrou. Foi um susto para ela, não fazia sentido. Afinal para onde teria ido a balinha?
Hoje ela me contou que perdeu uma outra balinha, (um prendedor de cabelo em forma de bala) e que está triste por isso.
Mas é uma tristeza conformada, uma tristeza adulta.
Por quantas perdas a minha menina teve que passar para ficar fortalecida.
Por que perder dói sempre e tanto.
Por que nos ligamos tanto a objetos que nem são comestíveis, mas que nos fazem falta como uma fome antiga.

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